quinta-feira, 25 de março de 2010

Fantasmas do Passado - Parte 5


Estava tentando tirar uma música da cabeça. Mesmo depois de tanto tempo com as mesmas bandas, nunca imaginou que The Cure seria sua banda preferida.
A música falava de olhar para fotos, sentir saudade daquele momento em que foram batidas, um momento que acaba no exato instante do flash. Tudo que cerca aquele milésimo estático impresso num papel pode ser muito profundo para alguém, a ponto dessa pessoa se perder em tanta nostalgia.
Para Daniela, era uma música perfeita.
Já era relativamente tarde em sua casa, sua mãe já estava dormindo, e ela já deveria estar também, mas sentia uma necessidade estranha de se manter acordada, para se manter pensando.
Começou a lembrar de uma reportagem que viu uma vez, sobre índios que para provar sua coragem precisavam escalar árvores e tirar pedaços de tocas de vespas com socos, entre outras provas absurdas. Se provasse sua valentia, ganhava o troféu, que consistia em ter uma pele grossa semelhante a dos crocodilos - o que era outra prova, já que para conseguir tal efeito, toda a pele de suas costas era cortado com uma gilete. Quando as feridas cicatrizazem, produziriam o efeito grosso das peles de um réptil.
Mas logo, lembrou de Matt.
Balançou a cabeça, lembrando de outra coisa que viu na TV, sobre uma de suas bandas preferidas, Coldplay. Era uma entrevista com o vocalista, que disse ter perdido a virgindade com 22 anos de idade. Ele falava de um jeito engraçado, a forma como contava as coisas, às vezes, parecia não estar falando de sua própria vida. Claro que estava, mas teve essa sensação ao assistí-lo divagar sobre sua adolescência conturbada.
E lembrou de Matt.
Maldita música que continua num loop infinito dentro de sua cabeça. Ao mesmo tempo que queria fugir do assunto, tinha prazer em se deixar levar por ele. Poderia caminhar até o trabalho e voltar, sequer percebendo o tamanho da viagem, enquanto sua mente se ocupava com outras coisas, deixando os pés guiarem-se automaticamente.
Queria ver filmes apenas sobre um assunto, ler um livro que falasse sempre de mesma coisa, cantar a mesma música para sempre.
Para sempre.
É uma expressão forte. Forte, impossível, boba e equivocada, mas essencialmente romântica. Balançou a cabeça de novo. Era bom ser romântica como antigamente, ainda que fosse contraditório com tudo que queria pensar. Quando tinha seus 16 anos, gostava de cair de cabeça. Sua cabeça era tão focada, tinha sempre tanta certeza do que queria, não duvidava de nada, sonhava com tudo. Onde foram parar essas ideias?, perguntava-se. Mas eram indagações inúteis, pois não levam a lugar algum.

Preparou algo para beliscar enquanto tentava assistir TV, mas o sono começou a fazê-la fechar os olhos sem perceber. Resolveu deitar, finalmente.
Era diferente estar assim com 27 anos, mas ainda não podia dizer se era melhor ou pior. Lembrou de como sua professora de artes costumava chamar um desenho feio de "diferente". Suspirou.
Estava lembrando de muitas coisas.
Mas fechou os olhos para aquele dia, ao mesmo tempo, desistindo de lutar, como geralmente fazia no final das contas. E no final das contas, não havia nada no mundo que a fizesse esquecer do quanto estava apaixonada.

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